segunda-feira, 16 de março de 2009

Marley, eu e um velhinho

Sabe aquelas histórias simples, por vezes bobas, mas que realmente nos tocam de alguma forma? Eu tenho uma dessas para contar.

Fazia um pouco frio para quem não se cobria com um casaco. Uma típica noite do final do verão gaúcho. Minha namorada, Tamíris, e eu, caminhávamos pela principal avenida de Bagé, a Sete de Setembro, na quadra situada entre a Bento Gonçalves e a General Neto. Quem conhece a cidade lembra de primeira: é onde fica o Imba, o Comercial, a Casa de Cultura e também duas galerias: a Kalil e a Sete. Esta última, onde está instalado o único cinema bageense – o Cine Sete, reinaugurado há poucos dias, e que rodou apenas dois ou três filmes até agora. Um deles, Marley e eu, que acabáramos de assistir.

Confesso: relutei um pouquinho para ver este filme. Apesar de ter lido algumas páginas do bom livro do jornalista e escritor John Grogan, que dá origem à trama, para mim não passaria de mais uma daquelas chatas histórias de cachorros-heróis. Me enganei. O que o diretor David Frankel conseguiu levar às grandes telas tem uma mistura muito interessante. Um bocado de humor e drama temperado com uma boa dose de essência humanitária, no sentido altruísta da palavra, já que a temática é a vida de um animal.

Realmente, a história tira boas risadas dos espectadores com as trapalhadas do cachorro destruidor de lares, no sentido literal da expressão mesmo. O final é emocionante. E isso era possível notar não apenas prestando atenção no filme. Mas na plateia que o assistia. Entre um diálogo e outro na telona, vários soluços nas poltronas. No término da trama, quando as luzes acenderam, rostos encharcados. Nas escadas de saída, todos comentavam: fulano chorou, sicrano também. Ou seja: todos. Menos eu. E de fato, me senti um extraterrestre por isso.

Mas ainda havia tempo para eu recuperar o meu espírito fraterno, que estava vagando por aí. E o encontrei. Na esquina da loja Tempoo, onde tem uma famigerada carrocinha de lanches. De longe avistei um senhor com barba branca e quase sem cabelos. Pequenino, magrinho e simpático, portava um rosto um pouco assustado. Carregava, também, um pacotinho com as minhas lágrimas.

Com a voz trêmula e confusa ele se apresentou. Parecia ser um daqueles velhinhos de rua. Estava sujo, com uma roupa consideravelmente nova, mas desarrumada. Cheirava mal, parecia não tomar banho há alguns dias. Não estava alcoolizado, como comumente encontramos tais figuras descritas.

Com uma expressão cheia de humildade, pediu: “por favor, me paga um pãozinho, que estou com fome?”, disse, apontando para o vendedor de panchos. Não ouvi com as orelhas penduradas à cabeça, mas sim, com as que estavam no coração. Dei de ombros para todo aquele discurso de que não se ofertava algo a pedintes. Não era isso o que importava. Fui lá e paguei o tal lanche para o homem. Resultado: um belo sorriso quase sem dentes, um forte aperto de mãos, um abraço daqueles de parar o mundo, e um beijo, além, é claro, da devolução de minhas lágrimas. Fiz questão de colocá-las rapidamente em meus olhos.

O senhor repetiu os mesmos gestos com minha namorada e depois nos despedimos. Cruzamos a Praça do Coreto e fomos para casa. Depois de alguns segundos, minha vida estava separada da vida daquele velhinho. Talvez para sempre. Não acredito que ele viva por muito tempo. Mas sem dúvida, a memória daquele momento caminhará ao meu lado por muitos anos.

Isto aconteceu às 23h32min de um dia qualquer. Agora são 2h47min da madrugada e ainda continuo pensando sem parar no que aconteceu.

15 comentários:

  1. Desculpa Rosa, mas eu não posso escrever! =~~
    shuahsaihsiahuhusuiahsuia.

    Que texto bem feito.
    Você conseguiu me emocionar. =)

    Parabéns.
    Um abração do Lekão.

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  2. ei, cara.. por isso te admiro profissionalmente e pessoalmente. Tu és dos melhores seres humanos que já conheci. Acho que tu e o Toneca vão pro céu sem estágio no inferno... hehehe... abraço, loco véio. Saudades de ti!

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  3. E aí meu velho!!!
    Fala sério, um texto com tanta percepção da realidade só podia mesmo sair desse cérebro.Espero que o blog seja o começo de uma caminhada cheia de tudo.
    Ah! O Felipe tem razão... tu és um dos melhores seres desse mundão de Deus.
    Te amo!!!
    Tia Vânia

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  4. Mano, o texto está incrivel, conseguisse me emocionar, vc escreve muito melhor do que fala, consegui visualizar a cena!!!!

    te amo!!!!!

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  5. Não me entenda mal, seu barbudo, fresco e miserável, tu bem sabe que não sou sentimental assim não é?... Mas só tu mesmo... Sem palavras.
    Pode ter certeza que agora tu tem um compromisso com esse blog!! Pq vou entrar aqui todos os dias. Grande Abraço.

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  6. Amigoooo! Como já disse e não canso de dizer, sou tua fã. É o mesmo Felipe que pode parecer durão, mas no fundo é um ser humano fantástico, incrível...
    Linda história, meu herói!!! hehehe
    Parabéns, como sempre escrevendo divinamente. Abraço e sorte sempre!

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  7. Bóó tinhoso! O velhinho trouxe as tuas lagrimas, e tu trouxe as nossas. Belo texto!
    Atras dessa barba e cabeleira existe um coração imenso. Cuida bem da Mima!
    beijão

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  8. ôôô meu primo amado...
    texto PERFEITO...
    sem comentários...

    te amo...

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  9. Rosinhaa!! q história heim!! coisas q acontecem na rotina do dia-a-dia e mtas pessoas não dão bola pra tal acontecimento.. mas teu coração é grande e tu é o cara.. sucesso pra ti velho!! abração!

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  10. ô seu cabeludo cretino;.. nada mais normal que vir de ti um texto, quer dizer, mais que isso, um momento tão sutil e grandioso, humano e divino! legal mesmo.. desejo que tu, eu , e todos as pessoas do mundo possam ver as coisas dessa nossa vida tão louca e cheia de pedregulhos com esses olhos humanos.. às vezes a gente perde tantas oportunidades de , por meio de um gesto pequeno, atingir a grandiosidade de espírito.. ihhhh , vou pararando por aqui,, hehehehe !
    um abraço fraterno!

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  11. só uma pessoa que transborda bondade e harmonia poderia escrever um texto de forma tao tocante...
    eu, como todos os anteriores, me emocionei.
    e percebo o quanto o jornalismo sempre vai ser fácil pra ti.pq tu nao só conta as histórias, faz com que as pessoas vivam elas por pequenos momentos.
    Um abração seu rosineido!

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  12. Cara....
    Não tem oque dizer..
    Ficou incrivel!
    O mundo precisa é disso...
    Pessoas boas e com coração puro!
    Parabéns cara!
    Abração!

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  13. ô Rosa, tu sabe que não sou teu amigo nem vou com a tua cara. mas, enfim, as reportagens ficaram muito boas. parabéns! hehehe...eu só não vou com a tua cara

    vou aproveitar o comentário do Rogério: "Pode ter certeza que agora tu tem um compromisso com esse blog!! Pq vou entrar aqui todos os dias"...eu também > pra quê nytimes, zh ou globo quando Felipe Rosa escreve? azah guri!

    um baita quebra-costela
    e se tu parar de escrever, te dou uma bordoada nos miolo.

    alessandro m. de oliveira
    (tentando ser engenheiro)

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  14. Oi Felipe! Tu não me conhece e nem eu te conheço, rs. Mas, nem lembro como, vim parar aqui no teu blog. Ele já está ali nos favoritos, e passo por aqui sempre que posso. Lindo esse post e parabéns pela sensibilidade! Desculpa o atraso do comentário, abraço!

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